As atividades diárias têm consumido o tempo das famílias e, por esta razão, pais e filhos, sejam estes crianças ou adolescentes, muitas vezes estão igualmente comprometidos em atividades fora de casa. Nesse comprometimento, a escola desempenha importante papel de acolhimento.
Sem considerar classe social, podemos observar que o espaço educacional se torna um local seguro, para o qual as famílias recorrem na busca de manter os filhos em atividade, enquanto trabalham. No entanto, repentinamente, a humanidade parou, sem sequer dar tempo para que as pessoas percebessem a gravidade do que acontecia ao seu redor ou olhassem sua agenda e programassem seu dia, entre outras providências.
Em um cenário de incertezas e sem definição clara de quando vai acabar, família e escola se deparam com uma nova realidade: nossas crianças estão em casa. E agora ?
Escolas, lojas, parques, cinemas, teatros e shoppings fechados. Trabalho e ensino remoto, portais sobrecarregados de atividades escolares, mudança de rotina, mudança de comportamentos sociais e higiênicos, crianças brincando, correndo, pulando, caindo, chorando, brigando, enfim, sendo crianças. Este passa a ser o novo cenário familiar.
Escolas vazias, parques sem movimentos. Corredores e salas ecoam diante de um incômodo silêncio. Poucas respostas, muitos questionamentos. Equipamentos eletrônicos substituindo lousas, em que o giz e a caneta não se fazem necessários. Aulas online para adolescentes e crianças, enfim, escolas sem suas vivências e interações presenciais, até então, uma de suas essências.
Mas, aos poucos, percebemos que essas mudanças oferecem vasto campo de aprendizagem e os desafios se tornam fatores propulsores ao conhecimento.
A possibilidade de os pais estarem mais próximos dos filhos tende a favorecer maior compreensão dos comportamentos apresentados por eles, que muitas vezes não foram percebidos.
A escuta da criança, digo não apenas a escuta verbal, mas a escuta dos gestos e das emoções, dos sentimentos, pode fornecer possibilidades de conhecê-la melhor. Este momento de convívio familiar pode ser otimizado pela participação das crianças nas atividades diárias, no auxílio com o cuidado às plantas, aos animais, na atenção aos idosos, à solidariedade aos menos favorecidos socialmente, à preocupação em se proteger e proteger o outro, valores sociais que exaustivamente têm sido exaltados e nem sempre praticados.
O ambiente familiar agora nos leva a um momento no qual práticas, até então triviais, propiciam motivações para significativas construções de aprendizados e são uma ótima oportunidade para o resgate de vivências, como histórias, brincadeiras e outras experiências que aguçarão e enriquecerão as memórias afetivas de nossas crianças.
O sistema educacional se mobiliza para atender seus alunos e garantir seu direito à educação. Para isto, educadores se reinventam a todo momento, paulatinamente demonstram e reafirmam sua resiliência diante das dificuldades educacionais que lhes são postas todos os dias.
Em nossa história, períodos de instabilidade foram inspirações para repensar a educação e a importância das interações sociais. Dado o momento de tantas incertezas, instabilidades, ressignificações e mudanças, cabe-nos pensar se as famílias serão as mesmas em suas relações e se as escolas serão as mesmas em suas concepções. Contudo, promover novos valores e olhares agora se torna o papel essencial da família e da escola.
Fala-se muito que não seremos mais os mesmos após esse “tsunami”, que o planeta se renovará, que seremos seres humanos melhores, mas conseguiremos isso no porvir ? A mudança de consciência é necessária, independentemente de qualquer pandemia.
Emicida, músico e compositor, assim questionou a respeito: “…não existe uma construção que anteceda este momento. Ele não tem força para sair de repente, de outro jeito. Então vamos sair todos mastigados e lindão do outro lado ?”.
Bem, diante de tantos questionamentos e reflexões, vem-me à mente Morin e as “escolas de compreensão humana”. Nossas crianças estão em casa. E agora ?
Agora é o momento de aprendermos juntos, nessa “escola” chamada família, todos os aspectos que nos tornam realmente humanos.
Um mundo novo só é possível com um homem novo, mais sensível à realidade que o cerca.
Profª Mônica Salles da Silva